O DJ Rennan da Penha está preso desde abril deste ano no Complexo de Gericinó, em Bangu, no Rio de Janeiro. Acusado de associação ao tráfico, o músico foi absolvido na primeira instância, mas o Ministério Público recorreu da decisão. Resultado: foi condenado, em um processo cheio de buracos, a seis anos e oito meses de prisão em regime fechado. O músico, conhecido por ter criado o Baile da Gaiola, festa gratuita que acontecia todo o sábado nas ruas da Vila Cruzeiro, na zona norte da capital carioca, foi o vencedor do Prêmio Multishow na categoria canção do ano e também concorre ao Grammy Latino. Ele respondia ao processo em liberdade há cinco anos. Por ter sido condenado na segunda instância e preso, não pôde receber o prêmio que ganhou.
A decisão do desembargador Antônio Carlos Nascimento Amado diz que o DJ era "olheiro" do tráfico, responsável por relatar a movimentação dos policiais no Complexo da Penha, onde acontecia o Baile da Gaiola. Além disso, a decisão também afirma que Rennan usava o baile para beneficiar os traficantes, como se a existência da festa em si contribuísse para venda de drogas ou tráfico de armas.
O processo contra Rennan demonstra como o sistema de justiça é racista e faz questão de criminalizar o funk – basta observar sua estrutura para perceber como ele não tem nada de neutro e imparcial.
O racismo estrutural aparece quando é a cor e não os fatos que
são usados para condenar alguém, ou quando,
nas audiências de custódia, brancos são liberados e negros permanecem presos.
De acordo com o Infopen, que reúne estatísticas do sistema penitenciário, o Brasil possui a quarta maior população carcerária do mundo. Entre os mais de 700 mil presos, 61,7% são pretos ou pardos. Esses números são a prova de que a população de pretos e pobres é a mais atingida pela seletividade do sistema. E grande parte dessas pessoas está presa em "zero instância": são presos que sequer foram julgados e ainda assim seguem encarcerados. Segundo o
Conselho Nacional de Justiça, 337.126 presos provisórios aguardam julgamento no país.
A Constituição brasileira diz que "ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado da sentença penal condenatória". Em bom português, ninguém poderia cumprir pena até que todos os recursos à justiça tenham se esgotado. Na decisão de quinta-feira, o STF decidiu cumprir o que diz o texto. Pressionado pelo impacto da Vaza Jato, que mostrou como o processo condenatório de Lula foi marcado por irregularidades e perseguições políticas, os ministros decidiram que uma pessoa só pode ser presa depois de esgotados os recursos. Com a decisão, Lula agora é livre.
Só que, seis meses antes, o próprio STF havia negado um pedido de habeas corpus para Rennan da Penha, afirmando que a prisão dele "não compromete o princípio constitucional da presunção de inocência afirmado pelo artigo 5º". Para o pedido, a defesa do músico havia se baseado na mesma Constituição que, agora, o Supremo resolveu cumprir.